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    REJEIÇÃO MATA CANDIDATURAS

    GAUDÊNCIO TORQUATO

    Falta uma semana para a onça beber água. O momento mais aguardado dos últimos tempos é o dia 2 de outubro, dia em que os esforços dos protagonistas da política serão testados nas urnas. Teremos a eleição mais paradigmática da contemporaneidade, eis que o processo envolve dois figurantes que despertam sentimentos de animosidade, conflitos entre eleitores, desavenças como nunca se viu.

    O teor de polêmica que Jair Bolsonaro e Luis Inácio puxam na arena social é um dos mais elevados de nossa história, o que se pode constatar nas taxas de rejeição que seus nomes provocam. O presidente é rejeitado por 52% do eleitorado, enquanto Lula apresenta 39% de rejeição, um índice até maior que o da intenção de voto em Bolsonaro, segundo última pesquisa do Datafolha. Esses números, vale registrar, não significam necessariamente uma opção por uma candidatura de terceira via, cujos nomes, principalmente Ciro Gomes e Simone Tebet, ainda não bateram nos dois dígitos. O que pode haver é o aumento das abstenções, votos nulos e brancos.

    Dito isto, vamos às observações. Pelo pouco tempo que os candidatos dispõem, parcela do eleitorado deverá votar de acordo com os gestos dos três macaquinhos: “não falo, não vejo, não ouço”. Será um voto às cegas.

    Quando um candidato registra um índice de rejeição maior que a taxa de intenção de voto, é bom começar a providenciar a ambulância para entrar na UTI eleitoral. Caso contrário, morrerá logo nas primeiras semanas do segundo turno, se houver.

    A rejeição constitui uma predisposição negativa que o eleitor adquire e conserva em relação a determinados perfis. Para compreendê-la melhor, há de se verificar a intensidade da rejeição dentro da fisiologia de consciência do eleitorado.

    O processo de conscientização leva em consideração um estado de vigília do córtex cerebral, comandado pelo centro regulador da base do cérebro e, ainda, a presença de um conjunto de lembranças (engramas) ligadas à sensibilidade e integradas à imagem do nosso corpo (imagem do EU), e lembranças perpetuamente evocadas por nossas sensações atuais. Ou seja, a equação aceitação/ rejeição se fundamenta na reação emotiva de interesse/desinteresse, simpatia/antipatia. Pavlov se referia a isso como reflexo de orientação. A rejeição tem uma intensidade que varia de candidato para candidato.

    Sabemos que Bolsonaro, por sua índole militar e linguagem desabrida, criou grande distância de parte da sociedade, enquanto os abnegados fazem fila ao seu redor. Mesmo assim, consegue a adesão de 1/3 do eleitorado, firmando-se como liderança. Da mesma forma, Lula, ao longo da história do PT, também criou um universo paralelo, jogando contingentes eleitorais em outras searas. Nos últimos tempos, ensaiou aproximação ao centro ideológico, convidou o ex-tucano Geraldo Alckmin para compor a chapa como vice e, assim, diminuiu a rejeição ao seu nome.

    Em São Paulo, Paulo Maluf, que sempre teve altos índices de rejeição, passou a administrar o fenômeno depois de muito esforço. Tornou-se menos arrogante, o nariz levemente arrebitado desceu para uma posição de humildade e começou a conversar humildemente com todos, apesar de não ter conseguido alterar aquela antipática entonação de voz anasalada. Os erros e as rejeições dos adversários também contribuíram para atenuar a predisposição negativa contra ele. Purgou-se, também, pelos pecados mortais dos outros. Ruim por ruim, votarei nele, pensaram muitos dos seus eleitores.

    A rejeição a determinados candidatos se soma à antipatia, ao familismo e ao grupismo. O eleitor quer se libertar das candidaturas impostas ou hereditárias. Mas não se pense que o caciquismo se restringe a grupos.

    Certos perfis, mesmo não integrantes de famílias políticas, passam a imagem de antipatia, seja pela arrogância pessoal, seja pelo estilo de fazer política, ou pelo oportunismo que suas candidaturas sugerem. Em quase todas as regiões do País, há altos índices de rejeição, comprovando que os eleitores, cada vez mais racionais e críticos, estão querendo passar uma borracha nos domínios perpetuados.

    Pesquisas qualitativas indicam as causas. Aparecerão questões de variados tipos: atitudes pessoais, jeito de encarar o eleitor, oportunismo, mandonismo familiar, valores como orgulho, vaidade, arrogância, desleixo nas conversas, cooptação pelo poder econômico, história política negativa, envolvimento em escândalos, ausência de boas propostas, descompromisso com as demandas da sociedade.

    O candidato há de montar no cavalo de sua própria identidade, melhorando as habilidades e procurando atenuar os pontos negativos. É erro querer mudar de imagem por completo, passar uma borracha no passado e cosmetizar em demasia o presente. Mas é também grave erro persistir nos velhos hábitos. Mudar na medida do equilíbrio. Mudar sem riscos. Todo cuidado com mudanças constantes e bruscas, de acordo com a sabedoria da velha lição: não ganha força a planta frequentemente transplantada.

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    Gaudêncio Torquato

    Porandubas Políticas | Por Gaudêncio Torquato – 31/08/2022Quarta-feira, 31 de Agosto de 2022. Abro a coluna com uma historinha da Paraíba.


    O caso ocorreu na encenação da Paixão de Cristo numa cidadezinha da Paraíba. O dono do circo, em passagem pela cidade, resolveu encenar a Paixão de Cristo na sexta-feira santa. Elenco escolhido dentre os moradores e no papel de Cristo, o “gatão” da cidade. Ensaios de vento em popa. Às vésperas do evento, o dono do circo soube que ‘Jesus’ estava de caso com sua mulher. Furioso, deu-se conta que não podia fazer escândalo sob pena de perder o investimento. Bolou uma maneira. Comunicou ao elenco que iria participar fazendo o papel do ‘centurião’.

    – Como? – reclamaram – O senhor não ensaiou!

    – Não é preciso ensaiar porque centurião não fala!

    O elenco teve que aceitar. Dono é dono. Chegou o grande dia. Cidade em peso compareceu. No momento mais solene, a plateia chorosa em profundo silêncio. Jesus carregando a cruz … e o ‘centurião’ começa a dar-lhe chicotadas.

    – Oxente, cabra, tá machucando!

    Reclamou Jesus em voz baixa.

    – É pra dar mais verdade à cena, devolveu o centurião.

    E tome mais chicotada. Chicote comendo solto no lombo do infeliz. Até que Jesus enfureceu-se, largou a cruz no chão, puxou uma peixeira e partiu pra cima do centurião:

    – Vem, desgraçado! Vem cá que eu vou te ensinar a não bater num indefeso!

    O centurião correndo, Jesus com a peixeira correndo atrás, e a plateia em delírio gritando:

    – É isso aí! Fura ele, Jesus! Fura ele, Jesus, aqui é a Paraíba, não é Jerusalém, não!

    Parte I – Panorama

    O debate da Band

    Uma surpresinha: quem esperava um duelo de vida e morte entre Lula e Bolsonaro, no primeiro debate da televisão aberta, viu golpes e estocadas vindos das laterais, desferidos por duas mulheres. A senadora Simone Tebet, com o apoio da colega, senadora Soraya Thronicke, ambas do Mato Grosso do Sul, ganhou o troféu da primeira batalha. Saiu da TV Bandeirantes como a candidata à presidente da República que melhor aproveitou os rounds da luta.

    Indecisos e…

    Parcela dos indecisos olha para o desempenho dos (a) candidatos (a) no debate e toma posição. Adere ao vitorioso. As bases de cada candidato são imutáveis. Consolidam suas decisões. E, como temos um eleitor mais racional este ano, diferente do eleitor de campanhas passadas, é razoável apostar na possibilidade de mudança de voto de certo núcleo que já havia escolhido seu candidato (a).

    Simone Tebet

    Teve ótimo desempenho na CPI da Covid. Fluente, experiente, professora, boa gestora como prefeita de Três Lagoas/MT, cara larga que ocupa toda a tela em primeiro plano, simpática, Simone, seja qual for o resultado do pleito, estará na agenda da política nos próximos tempos. Tornar-se-á conhecida e, assim, mais palatável ao gosto do eleitorado.

    O novo Lula

    O Luiz Inácio Lula da Silva de 2022 não é o Lula de ontem. Cabelos embranquecidos, com áreas vazias, voz mais rouquenha que a do costume, algumas vezes incompreensível. A contundência do passado tem sido amenizada pela sua caminhada ao centro do arco ideológico, ditada pela decisão de repaginar seu manto de cores radicais. O Lula do centro, com Geraldo na chapa como seu vice, é menos incisivo para desgosto de sua base tradicional. O novo Lula não empolga tanto como no passado. Sua voz, muito rouca, prejudica o desempenho. Falta de fonoaudióloga, dizem. Mas tem carisma.

    Ciro

    Deve ir até o final, sem desistência e sem vontade de aderir à chapa encabeçada por Lula, conforme aceno deste no debate da Band. Ciro saiu-se bem, é o mais preparado dos candidatos, mas tem problema de imagem. Um perfil tempestuoso. Trata-se de uma fonte inesgotável de dados, informações, comparações, conhecimento de Brasil. Parte de suas ideias se perde no emaranhado de uma fala que corre mais que lebre fugindo do caçador.

    Bolsonaro

    Facilmente irritável, inesperado e pronto para enfrentar a briga. Palavroso, dispara um canhão de palavras de mal trato, deseducado, comete um disparate com a maior tranquilidade. Mas suas bases vibram com suas peripécias linguísticas. Suas motociatas ficarão na história das campanhas eleitorais. Não tem escrúpulos. Atira contra uns e outros, mais ainda contra umas (mulheres) e outras (mulheres). Uma cultura extremamente machista. Um cara corajoso. Sem querer esconder seus maus costumes. Como lembra Vera Magalhães: não gosta de ser questionado por mulheres.

    O último mês

    Quando setembro vier… (quem se recorda do filme de Robert Mulligan, com Rock Hudson, Gina Lollobrigida e Sandra Dee?). Pois é, setembro virá amanhã. O tempo de a onça beber água. O mês de eventuais viradas de chapas preferenciais. Ou até de consolidação de posições já tomadas pelo eleitor. Dia 15 é um prazo-chave. Vejamos se pesquisas ainda são diferentes ou tendem a aproximar seus números. Nenhum Instituto quer passar recibo de parcial, vendido, mentiroso. Dia 20, a 12 dias do pleito, o clima será de “quase” definitivo. Por que o “quase”? Pelo respeito que tenho ao Senhor Incomparável dos Anjos.

    Eleição sob o bolso

    Volto a repetir. A economia será o guia do eleitor nas urnas. Não vou repetir minha equação para não ser tão recorrente. Mas o estado geral da sociedade – satisfação/insatisfação, felicidade/infelicidade/, alegria/amargura, ditará o resultado das urnas. E tais estados de espírito costumam ser balizados pela economia, pelo bolso capaz de fazer a feira, pagar o remédio, a passagem de trem ou de ônibus. Lembro ainda: aquele Senhor (acima citado) costuma visitar o Brasil.

    Os programas eleitorais

    As velhas receitas voltaram em cheio para maltratar os ouvidos dos telespectadores. Mensagens repetidas saturam. Histórias humanizadas de alguns protagonistas parecem artificiais. Animais, vozes de narração esportiva, sobrenomes hilários, João Ponta Grossa, Manezim da Esquina, Lourival do Jabá, figuras estrambóticas, números gritados, falas gritadas, numa algaravia (confusão de vozes) de Torre de Babel, educação, saúde, transportes, enfim, um palavrório sem pé nem cabeça – esse é o calvário que temos de suportar nas próximas semanas. Bons programas. E aguardem o 2º turno.

    O Brasil será outro

    Aqui segue minha visão sobre o amanhã. O Brasil caminhará por outras vias. Não significa que teremos de mudar tudo. As exigências de uma comunidade exigente, crítica e com tendência a participar do processo decisório com mais firmeza são pressupostos para a formação de polos de poder e pressão em todo o território. A esfera política, por sua vez, vai focar sua ação nesse processo. E tomará decisões mais afinadas à sociedade. Da mesma forma, agirão os poderes Executivo e Judiciário.

    Parte II – Secos & molhados

    – 7 de setembro não terá parada militar, mas um espetáculo militar na praia de Copacabana. Quem apostou em refluxo das FFas perdeu. Vai haver saltos de paraquedistas, tiros de canhão do Forte de Copacabana, urros e gritos, bastante gente na motociata de Bolsonaro.

    – Marcas difíceis de apagar: corrupção no governo Lula; desprezo de Bolsonaro pelas mulheres e má gestão da pandemia; estrebuchadas do Ciro Gomes; desfile de perfis insossos na programação eleitoral.

    – Dinheirama não dá direito à vitória; eleitor é sabido.

    – Mulheres deverão fazer bancada forte na Câmara e Assembleias estaduais.

    – O soberano, segundo Thomas Hobbes, em Leviatã (1651), ouvia seus conselheiros de um a um, nunca em conjunto.

    – A obra é fundamental para o entendimento do comportamento humano, sobretudo no que tange ao poder, sua organização, exercício e compreensão pelo homem, além de ser um dos pilares fundamentais tanto da sustentação daquele regime quanto da compreensão do universo político, guardadas as devidas diferenciações e proporções, em todo o mundo e em todos os tempos.

    – Governantes: separem o Estado laico da religião. Não confundam alhos com bugalhos.

    – Maior conhecimento dos candidatos implica maior adesão ou distanciamento por parte do eleitor.

    – Candidatos: observem a lei das maiores quantidades. Maiores conjuntos eleitorais carecem de maior presença dos protagonistas.

    – Rejeição é fator crucial em um 2º turno. E chave do portão no primeiro turno.

    – Em São Paulo, a disputa para entrar no 2º turno será uma das mais acirradas do país.

    – Este analista acredita em viradas eleitorais de última hora. Quando o vento correr para determinado lado, não há força que o detenha.

    – Teremos um pleito com a maior organicidade social no país. Com o maior número de entidades representativas dos conjuntos sociais e profissionais.

    Fecho a coluna com a época da Inquisição.

    Dez truques

    Dez truques dos hereges para responder sem confessar:

    1. A primeira consiste em responder de maneira ambígua.

    2. O segundo truque consiste em responder acrescentando uma condição.

    3. O terceiro truque consiste em inverter a pergunta.

    4. O quarto truque consiste em se fingir de surpreso.

    5. O quinto truque consiste em mudar as palavras da pergunta.

    6. O sexto truque consiste numa clara deturpação das palavras.

    7. O sétimo truque consiste numa autojustificação.

    8. O oitavo truque consiste em fingir uma súbita debilidade física.

    9. O nono truque consiste em simular idiotice ou demência.

    10. O décimo truque consiste em se dar ares de santidade.

    (Manual dos Inquisidores – escrito por Nicolau Eymerich em 1376. Revisto e ampliado em 1578 por Francisco de La Peña).

    Resposta de Lula a uma pergunta se houve corrupção em seu governo:

    • Ora, se delatores confessaram o roubo, é porque houve.
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    GOLPE? SOCIEDADE DIZ NÃO.

    GAUDÊNCIO TORQUATO

    Abro este texto sob as primeiras impressões do evento no salão nobre da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco, onde o ex-ministro da Justiça, José Carlos Dias, leu, dia 11, quinta, por volta das 11 horas, a Carta em Defesa da Democracia, após discursos de representantes de entidades da sociedade civil.

    A inferência mais abrangente é a de que, se havia alguma articulação sub-reptícia para golpear, dia 7 de setembro próximo, a ordem democrática, foi sustada pelo mais incisivo movimento empreendido pela sociedade brasileira nos últimos tempos. A Carta foi um eloquente discurso em prol do sistema democrático e, mais que isso, um vistoso sinal da nossa democracia participativa.

    A comunidade levanta a mão e avisa: não toleraremos qualquer desvio autoritário no regime. Iremos às ruas, se for o caso.  Viu-se intensa mobilização, comparável em simbolismo ao famoso Comício das Diretas – Já, realizado em 16 de abril de 1984, o último e o maior comício em favor das eleições diretas, que reuniu 1,5 milhão de pessoas no Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo.

    A projeção que se faz oportuna é de que a corrente em defesa da democracia tende a crescer, face à imagem de pedra jogada no meio da lagoa, que a leitura da Carta nos transmite. Essa percepção se acentua ante a análise dos organizadores e assinantes do documento, que beiram 900 mil pessoas, de segmentos profissionais variados, e originários do meio da pirâmide social. A recorrente comparação que ancora os argumentos deste analista é: as classes médias exercem o poder de irradiar seu pensamento, a partir do meio da lagoa até as margens.

    Esse poder é alavancado pela integração das mídias na divulgação do movimento. Desse modo, é bem provável que a defesa da democracia ganhe mais apoios do que a tese do fechamento do regime, e consequente instalação de mecanismos autoritários.  

    A comunidade nacional, por sua vez, age como a panela de pressão. A fervura precisa que a panela tenha um buraquinho para deixar vazar o ar quente, sob risco de explosão. Os movimentos sociais, as manifestações de ruas, aplausos e urras são o vapor que, ao vazar, deixa o sistema em equilíbrio. O perigo é de ruptura no processo, com forte corrosão social.

    O fato é que a comunidade utiliza meios para se exprimir. Exemplos são seus representantes nas Câmaras de Vereadores, nas Assembleias Legislativas nos Estados, na Câmara Federal e no Senado. Quando esses mecanismos não agem a contento ou quando, mesmo sob sua ação, os Poderes Executivos (federal, estadual e municipal) não atendem ao clamor social, a população reage. É quando a democracia participativa entra na arena de guerra. Esse sistema também conta com o plebiscito, o referendo e o projeto de lei de iniciativa popular. Mas, em momentos de crise, como o que estamos vivendo, e sob um ambiente eleitoral polarizado, a sociedade escolhe a ferramenta do aviso direto: a movimentação de rua.

    No Brasil, a organicidade social é um dos mais interessantes fenômenos da contemporaneidade. Significa que as massas d’outrora estão dando lugar a grupos, setores, núcleos, alas, que passam a agir em defesa de seus interesses. A isso chamo de poder centrípeto, que vem das margens e vai até os centros, os poderes constituídos. Essa força centrípeta, de lá para cá, é o novo desenho dos poderes da Nação. E quem quiser ter sucesso na política, não pode desprezar tal sinalização.

    O Brasil, mesmo que se reconheça a prevalência de padrões tradicionais – o grupismo, o mandonismo – caminha, a passos lentos, porém, graduais, na direção da esfera racional. Que tem na autonomia um dos seus motores. Autonomia quer significar capacidade de o cidadão decidir, sem se valer da influência de outros. Claro, a equação BO+BA+CO+CA (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça) poderá influenciar o voto. Devemos reconhecer: já teve mais força no passado.

    Hoje, coisas como a Carta aos Brasileiros, harmonia social, desenvolvimento, paz, segurança, igualdade, educação, saúde, mobilidade urbana, habitação, conseguem chegar aos ouvidos do anônimo escondido na multidão. Que eleva sua condição de cidadania e sabe distinguir trololós de compromissos sérios.

    Rezemos um Pai Nosso!

    Gaudêncio Torquato é jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político – Twitter@gaudtorquato

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    Cenário otimista e segurança para empreender.

    Saiba o que os Estados Unidos oferecem para quem deseja internacionalizar uma empresa

    *Por Marcelo Fantin

    As relações entre os Estados Unidos e o Brasil em questões de comércio e investimento ocorrem por meio de uma série de iniciativas.

    Em 2011, os Estados Unidos e o Brasil assinaram o Acordo de Cooperação Comercial e Econômica para aumentar as relações bilaterais no comércio e no investimento entre duas das maiores economias das Américas. Desde então, o acordo ampliou e aprofundou essa relação incluindo inovação e facilitação de transações comerciais. 

    Assim, os números do primeiro semestre de 2022 marcaram um novo recorde no comércio de bens entre Brasil e EUA, de USS 42,7 bilhões, representando um aumento de 43,2% sobre o mesmo período de 2021.

    No entanto, no primeiro semestre de 2022, o Brasil regìstrou o seu maior déficit com os EUA no período em toda a série histórica, no valor de USS 7,4 bilhões. Esse também foi o maior recuo do País em relação a qualquer parceiro comercial em 2022. (Fonte: AMCHAM)

    Essa má performance deriva, em grande parte, à escalada das cotações internacionais de produtos de energia e alimentos, cujo maior impacto é causado pela guerra na Ucrânia influenciando o desempenho de itens importantes do comércio bilateral, como petróleo e derivados, fertilizantes, insumos químicos, e diversos outros.

    Desta forma, o cenário de elevado aumento dos preços internacionais e os resultados bilaterais já registrados no primeiro semestre, fazem com que previsões apontem para alta probabilidade da ocorrência de valor recorde no comércio bilateral para o ano de 2022, com crescimento expressivo das importações e, em menor medida, também das exportações.

    Após mais de uma década da assinatura do acordo, a evolução do comércio bilateral entre os dois países apresenta excelentes resultados, retomando seu crescimento, principalmente a partir de 2018, com a retomada da aproximação entre os países, trazendo números animadores.

    O crescimento de 31,9% das exportações do Brasil para os EUA no semestre ficaram bem acima do aumento de 20,5% das exportações totais brasileiras. Também houve acréscimo de 52,4% das compras brasileiras originárias dos EUA, e foram quase o dobro do incremento de 30,9% das importações totais do Brasil no semestre, sendo que os EUA tiveram o maior crescimento em valores absolutos nas médias diárias de exportação e de importação entre os dez principais parceiros comerciais do Brasil.

    Portanto, os EUA seguem como segundo principal parceiro comercial do Brasil, com participação de 14,5% no total das trocas comerciais brasileiras. A China mantém-se em 1º Iugar, com 25,6 % do total.

    Brasil e Estados Unidos têm tido uma relação histórica de proximidade de longa data. Os EUA foram o primeiro país a reconhecer a independência do Brasil, enquanto o Brasil foi o único país sul-americano a lutar ao lado dos aliados na Segunda Guerra Mundial. Hoje, as duas maiores democracias do hemisfério ocidental colhem os benefícios desse acordo comercial, com empresas brasileiras exportando ativamente bens e serviços para os EUA.

    O investimento direto dos EUA no Brasil é liderado pela manufatura, finanças, seguros e mineração. As vendas de serviços no Brasil por parte de afiliados de propriedade dos EUA apresentam grande projeção e desempenho positivo.

    Os números do comércio bilateral são animadores e o mercado norte-americano representa uma importante oportunidade para as empresas brasileiras. Com uma população de mais de 327 milhões de pessoas, é 50% maior que o mercado brasileiro e tem como principais atrativos a moeda estável e os hábitos de consumo incomparáveis, que tornam o mercado americano o ambiente ideal para que um empresário brasileiro invista e desenvolva seu negócio com segurança e grande possibilidade de crescimento, sendo um dos mercados mais abertos e acessíveis do mundo para empresas estrangeiras.

    No entanto, é importante que um empresário que queira investir neste mercado entenda as questões regulatórias e requisitos legais, porque cada indústria tem suas próprias regras e as empresas estrangeiras precisam estar cientes de regulamentações federais, estaduais e locais específicas, uma vez que licenças podem ser necessárias e diferentes para cada estado.

    O mercado americano com certeza é um dos mais desejados por empresários que almejam internacionalizar o seu negócio ou começar uma empresa no exterior, existindo muitas vantagens, as quais permitirão que o empreendimento se erga e se desenvolva em meio a uma economia estável e com uma legislação muito atraente, sem surpresas e de forma coerente, com leis trabalhistas mais favoráveis e tributação menos burocrática, que facilitam a gestão da empresa, deixando mais espaço para o empresário investidor desfrutar deste mercado voraz por consumo, com leis e regras claras. Quem optar por iniciar ou transferir seus negócios para os EUA, com absoluta certeza, atuará em um mercado que abre as portas para negócios em todo o mundo.

    Entretanto, para dar início a sua jornada, a primeira coisa é entender os tipos de empresas que podem ser abertas e quais delas se encaixam ao modelo de negócio proposto. O tipo mais básico de pessoa jurídica na EUA é o Sole, “proprietário único”. Esse tipo de empresa não precisa de razão social e pode usar o próprio nome do empresário, sendo que a empresa não paga impostos diretamente. Todo os trâmites fiscais são feitos diretamente com o fisco como pessoa física em relação ao que vier a lucrar com o negócio. No entanto, vale ressaltar que não poderá haver dívidas em nome da empresa.

    No entanto, o modelo mais simples e mais popular é a Sociedade de Responsabilidade Limitada (LLC), que é uma estrutura de empresa criada recentemente e que consiste em uma sociedade societária limitada. Nela, o empresário tem a opção de abrir empresa nos EUA se incluindo na estrutura empresarial individualmente ou com sócios. Essa estrutura é bastante popular entre as pequenas empresas de um único dono, com vantagens da propriedade individual, sem a exposição dos bens do dono. A maior vantagem da LLC é que possui um baixo custo para ser criada e exige pouca formalidade. Mas o empresário tem neste modelo uma responsabilidade limitada. 

    Já a Corporação é a forma mais comum para as grandes empresas, com a vantagem de abrir a empresa nos EUA com a possibilidade de abertura de capital, um procedimento relativamente comum nos Estados Unidos. Além disso, como uma entidade separada, a Corporação tem várias características distintas, como responsabilidade limitada, fácil transferência de porções da empresa, pode ser gerenciada por alguém que não seja seu dono, os impostos são pagos pela empresa e são separados dos donos.

    No entanto, esse tipo de empresa, também traz consigo desvantagens. Em primeiro lugar, sua estrutura exige muita formalidade, ainda a possibilidade de tributação dupla, já que a empresa é taxada e os dividendos que são passados aos donos também são sujeitos ao imposto de renda de cada um.

    Existem ainda outros tipos de empresa, como a GP (General Partnerships/sociedades gerais), que são modelos com dois ou mais sócios que dividem as responsabilidades do negócio. A participação do sócio influencia na divisão dos lucros, prejuízos e na tributação. Também a LP (Limited Partnership/Sociedades Limitadas), que são empresas que têm mais de um sócio. Nela, os deveres dos sócios podem ser limitados ou ilimitados dependendo de sua formulação. A tributação desse modelo leva em consideração o patrimônio dos sócios. Ou ainda, a LLP (Limited Liability Partnership/Sociedade de Responsabilidade Limitada), empresas com dois ou mais sócios que são responsáveis pela administração do negócio e seguem o que foi acordado no contrato social e as responsabilidades e tributações são proporcionais à participação de cada sócio na empresa.

    Portanto, dado o cenário histórico das relações bilaterais entre Brasil e Estados Unidos, as perspectivas excelentes para o ano, com a retomada dos negócios e consequente reaquecimento da economia após o período de pandemia causada pela COVID-19, o cenário para investimentos de empresários brasileiros é muito favorável em todos os sentidos. No entanto, vários cuidados devem ser tomados e cabe ao empresário investidor munir-se do maior número de informações possíveis em relação a sua atuação no mercado, ter um planejamento consistente, um plano de negócios detalhado e adequar o tipo de empresa que irá abrir ao modelo de negócio e pretensões empresariais para que não existam surpresas ou decepções e assim prosperar adequadamente e conforme o planejado.

    *Marcelo Fantin é advogado especializado em Direito Internacional Empresarial, com experiência de mais de 20 anos de atuação em diversos ramos empresariais.

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    O LIMBO

    GAUDÊNCIO TORQUATO.


    No Além, há quatro universos: céu, purgatório, inferno e limbo. É o que prega a Igreja Católica. Fiquemos neste último. O limbo é “a fronteira do inferno”, o lugar de almas que não merecem subir ao céu. E que, segundo a Igreja de Roma, também não são condenadas a padecer o fogo do inferno. O conceito original se voltava para crianças não batizadas, designadas de pagãs.

    Usando o simbolismo, puxemos a ideia para o campo da política. O governo de Jair Bolsonaro não é criança pagã, mas sua índole, sua identidade, seu modus operandi nos fazem pensar que ele está no limbo, na fronteira com o inferno, haja visto o estrago que tem feito ao tecido institucional. 

    Que estrago, indagam alguns? O afrontamento à Corte Suprema, em desafio aberto ao Poder Judiciário, o patrocínio de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que possibilitará o montante de mais de R$ 40 bilhões para cooptar votos, a intervenção na Petrobras, entre outras ações arbitrárias. O argumento é de que os mais pobres carecem de proteção, daí a mão forte do Estado na costura do cobertor social, a diminuição do preço de combustíveis, o combate ao STF por “judicializar” as políticas públicas, entre outras ações.

    O presidente Jair, com sua verve prolífera, põe lenha na fogueira nacional, que tende a causar mais e mais estragos. Parece querer acender o pavio do caos, preparando terreno para eventual intervenção, algo como um golpe. A depender do resultado das eleições de 2 de outubro.

    O governo é um ente à procura de um rumo. Sem ideias, ou melhor, com uma única ideia: desenhar o ambiente social e político para permitir que o presidente se reeleja. Para tanto, o pacotão de bondades(?) foi para o colo do Centrão, mobilizando partidos de todo o espectro ideológico para aprovar a PEC Kamikaze (suicida por furar o teto de gastos). 

    Qual é o eixo que movimenta a engrenagem governativa? Qual é a política de desenvolvimento? Inexiste.   Lembrando.  Fernando Henrique garantiu dois mandatos montado no cavalo da estabilidade econômica e amparado em reformas fundamentais no aparelho do Estado, cujos efeitos positivos foram se esgarçando ante a emergência de novas expectativas sociais. 

    Lula da Silva e seu PT chegaram ao centro do poder, depois de costurar por décadas e com muita intransigência os fios de seus particularismos. Aí chegando, embriagados com o sumo do poder, na esteira da verticalização de cargos no governo (coisa que o próprio presidente Lula chegou a reconhecer), desfizeram os traços que davam nitidez a seus perfis, particularmente no que diz respeito à bandeira ética, brandida nos palcos iluminados da política. 

    As oposições intensificaram uma locução de teor crítico cujo fundamento era menos um escopo programático e mais o comportamento de atores principais e secundários do palco governamental. O embate de uns contra outros.

    Trata-se de uma disputa de rua. São tempos do “embaciamento” do jogo político, ou, como denomina Roger-Gérard Schwartzenberg, uma “uniformização no cinzento”. O posicionamento dos partidos numa zona descolorida, no grande arco central da sociedade, está a demonstrar alto grau de flexibilização, um pragmatismo voltado para resultados. 

    Cada vez mais assemelhados, partidos e líderes estão menos preocupados em trabalhar no campo das ideias e mais interessados em conquistar o “poder pelo poder”. 

    Parcela do Parlamento substitui os horizontes abertos do desenvolvimento pela visão imediata e ligeira de investigações, agora sob a égide de CPIs. 

    Quem tem ideia, por exemplo, do que pensam os maiores partidos, como União Brasil, PP, PSD, PL, PSDB, MDB, a respeito de um projeto para o país? Do PT, sabemos que se desloca para o centro, ocupando flancos da socialdemocracia. É a estratégia de Lula para ganhar maiores contingentes eleitorais.

    No fundo, a intenção visível de fortalecer o “centralismo democrático” significa o resgate do Estado gordo, com as funções de intervir fortemente no mercado, calibrar e monitorar os fluxos da locução na mídia massiva. 

    Os grupamentos se reúnem nas antessalas do poder, onde se serve o caldo insosso de uma cultura sem discurso com sobremesa de geleia partidária. É bem verdade que o Brasil não é exceção na moldura da banalização da atividade partidária que se observa em praticamente todos os quadrantes mundiais. 

    L. de Crescenzo, escritor italiano, ensina: “O poder é como a droga e sempre exige doses maiores”. Vale tudo para ampliar espaços.