Momento Grandes Mulheres- Lilian Dias Gonçalves
Lilian Dias é uma apresentadora de TV e jornalista, especializada em agronegócio, que conheceu metade do Brasil viajando a trabalho tanto para o setor agropecuário quanto para eventos corporativos. Fazem parte de seu currículo profissional os seguintes estados: Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima, Alagoas, Piauí, Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás (Distrito Federal).
A passeio, conheceu Santa Catarina, Ceará, Argentina, Chile e Estados Unidos (Nova Iorque, Nova Jersey e Miami). Seu lema é: “Dessa vida só levamos o conhecimento que adquirimos e as viagens que realizamos. É o dinheiro mais bem empregado do mundo”. Lilian lamenta ter conhecido o exterior somente aos 37 anos, porque passou a vida trabalhando, inclusive nas férias, mas afirma que nunca é tarde para se tornar um viajante.
“Fui motivada a viajar para o exterior por um ex-namorado e serei eternamente grata a ele. Lembro-me que íamos para Buenos Aires e fiz pouco caso, dizendo que não haveria muita diferença em relação ao Brasil. Queimei a minha língua, porque fomos à Puerto Madero e foi uma das melhores refeições da minha vida, além de uma vista maravilhosa frente ao porto e seus navios. Também zombei quando fomos à Nova Iorque tentando comparar o Central Park ao Parque do Ibirapuera – risos. Somente quando coloquei os pés em Manhattan, percebi a tamanha heresia que havia dito. É muito comum quem só viaja a trabalho, que mal aproveita um momento de lazer, ou quem nunca saiu do Brasil, desdenhar e minimizar lugares extraordinários. Outro dia um amigo com quase 50 anos, que nunca viajou para o exterior, me disse que não faria muita diferença conhecer outros países porque ele já havia provado muitas comidas estrangeiras. Meu Deus, quanta ingenuidade, não sabe de nada inocente – risos. Não se trata só dos sabores, mas da cultura, das pessoas, dos serviços, da atmosfera que envolve aquele ambiente diferente, da “vibe” do local que liberta a nossa mente. Quem pensa assim, de modo tão provinciano, está se fechando para uma das experiências mais incríveis dessa nossa viagem e passagem pelo mundo terreno”, explica a jornalista, com os olhos brilhando.
Nascida na cidade de São Paulo, Lilian foi uma menina-moleca da cidade grande com diversões do campo. Ainda bem pequena, com uns 4 ou 5 anos, um querido vizinho – como se fosse o avô materno que não teve a oportunidade de conhecer – mantinha uma horta no quintal de casa e a mãe dela pedia que fosse colher salsinha fresca enquanto preparava a carne moída do almoço. Ela achava aquilo o máximo, porque sentia que tinha um supermercado dentro da própria casa, onde havia outras duas residências num quintal gigante dividido em duas partes: dianteira e traseira. Na parte do fundo, havia um pé de ameixas amarelas. “Na minha inocência, e sem frescura alguma, eu colhia a ameixa, a levava direto para a boca e só depois daquela generosa mordida é que notava que havia bicho. Nem preciso dizer que só havia metade dele, né? – risos. Pois é, mas pulemos essa parte nojenta (eca!!!), embora seja uma lembrança deliciosa”, conta se divertindo.
E olha só: o contato dela com árvore frutífera na infância não parou por aí, não. Na casa da tia materna, também em plena capital paulista, tinha um pé de jaboticaba plantado numa área interna da residência cujo tronco ultrapassava a laje. Pasme: ela devia ter uns 7 ou 8 anos quando subia na laje com os primos e comia jaboticaba direto do pé, e para variar sem lavar o fruto, olhando do alto a cidade rodeada de concreto.
Aos 10 anos, costumava ir ao sítio de um amigo da família e ajudava a colher chuchu, comia mel direto do favo, colhia cebola, adorava chupar cana e também se divertia entre tantas outras plantações. Lilian transitava entre a cidade e o campo com a mesma naturalidade de quem sai de casa hoje para ir ao shopping center. E quando não pisava na terra no campo, a menina pisava descalça na terra das ruas de São Paulo que ainda não tinham asfalto, quiçá paralelepípedo, que hoje não passa apenas de um palavrão para a garotada que mora nos bairros asfaltados mais nobres de São Paulo.
“Quando chovia na capital paulista, era lama para tudo quanto é lado. A gente voltava para casa marrom, achando que só bastava lavar os pés para jantar e dormir. Quando não estava subindo em árvore para comer frutas direto do pé, eu estava correndo pelas ruas, descendo ladeiras com carrinho de rolimã, ou descendo ladeiras cobertas por grama – o famoso morrão no bairro da Pompéia – com o bumbum apoiado em caixas de papelão que improvisavam um tobogã gigante. Também brincava no interior de casas em construção para fazer guerra de barro. Tive uma infância privilegiada me dividindo entre o campo e a cidade. Tive sorte”, fala com um olhar perdido de quem sente saudades dessa época.
Mas nem tudo foram flores na vida dessa menina. Até tornar-se jornalista, passou por muitas vitórias e derrotas. A primeira queda foi aos 11 anos, quando o pai foi enganado por um advogado que intermediava a desocupação da casa onde a família era inquilina e veio uma ação de despejo da noite para o dia. “Esse foi o meu primeiro contato com a corrupção brasileira que quase dizimou a minha família. Eu, meu pai, minha mãe, um casal de irmãos e uma prima de criação, todos adolescentes, e a minha vira-lata meio cocker spaniel, estávamos no meio da rua da noite para o dia. Perdemos tudo. Era o ano de 1986, os aluguéis tinham disparado e os salários não acompanhavam o ritmo da inflação que chegava a superar os 80% de alta ao mês. Então, fomos morar de favor na casa de parentes apenas com as roupas e alguns pertences pessoais. A Laika, a minha cadelinha, ainda conseguiu levar a casinha dela (risos). Passamos por muitas humilhações por cerca de um ano. Jurei para mim mesma que jamais voltaria a viver aquilo novamente”, desabafa, mas sem ressentimentos.
A garota focou nos estudos, porque sabia desde criança que queria ser jornalista, embora tivesse sido desmotivada por uma amiga da família. Começou a trabalhar aos 13 anos, não por necessidade, mas por opção, e desde então nunca mais parou. Foi atendente de locadora de vídeos, foi professora de piano para inciantes – o pai dela é músico –, atendente de loja em shopping onde tinha que passar o dia inteiro em pé e ainda esfregar o chão e lavar pano sujo ao fim do dia. O que ganhava mal dava para pagar a faculdade, cuja mensalidade era complementada pelo irmão mais velho. Enfrentou ônibus e mais ônibus lotados, ia sentada no motor do transporte por não aguentava mais ficar tanto tempo em pé e muitas vezes não saiu para o intervalo da aula porque não tinha dinheiro para lanchar. Mas nada disso a esmoreceu. Seu objetivo era um só: tornar-se jornalista.
Teve tranquilidade financeira no auge da faculdade, quando tornou-se bancária, mas no último ano tomou a difícil decisão de largar o emprego com ótimo salário para começar na Comunicação. Largou o banco, fez um curso profissionalizante tornando-se radialista antes mesmo de ser jornalista, mas levou tempo para se recolocar no mercado. Passou novamente por muitos perrengues até, finalmente, ser contratada pelo departamento de Comunicação de uma das maiores empresas de Recursos Humanos do País e seis meses mais tarde integrou a equipe de jornalistas da Rádio Bandeirantes AM, ao lado de lendas como José Paulo de Andrade e Salomão Ésper, apresentadores do Jornal Gente.
Daí por diante foi construindo o seu nome no mercado. “O segredo do sucesso profissional está em entregar mais do que lhe pedem, ficar longe das fofocas, ser surdo com os que não acreditam em você e não julgar as pessoas. Apenas trabalhe com honestidade e o universo lhe devolverá o que você merece. É como no Agro: plante bem e fará uma excelente colheita”, ensina a jornalista.
Aos 30 anos, o contato com o agronegócio adormecido na infância veio à tona. Foi convidada a ocupar o cargo de chefe de reportagem do Canal Terraviva, do grupo Band, que havia estreado havia pouco mais de um mês. Lilian teve um “caso de amor” com a Band por mais de 20 anos, entre idas e vindas pela Rádio Bandeirantes AM, em 96, TV Band aberta, em 2001, e Terraviva, em 2005 – quando trabalhou por 6 meses e pediu demissão para ter o primeiro filho –, e o último retorno, quando foi convidada para reintegrar a equipe em 2006 e ficou até 2018.
Ocupou o cargo de gerente de jornalismo do Terraviva de janeiro de 2008 até janeiro de 2018. Foram inúmeros desafios e conquistas. Liderou a transição da emissora do sistema analógico de edição e exibição para o digital, gerenciou dezenas de coberturas ao vivo de feiras agropecuárias de todo o País e coordenou equipes vencedoras de cinco prêmios jornalísticos: Allianz, FMC, CNA, Andef e LIDE. Paralelamente, durante todos esses anos, também realizou dezenas de eventos como mestre de cerimônias nos mais variados segmentos, atendendo empresas como Ford, Soluções Usiminas, E-bit, Editora Globo, antiga Eletropaulo, Nürnberg Messe, entre outras.
Aos 43 anos, numa situação muito mais delicada, com dois filhos para criar – uma menina de um ano e um menino de 11 anos –, cometeu o que veio a ser chamado de loucura por pessoas próximas. Lilian largou um empregão de 12 anos de duração, com excelente salário, flexibilidade de horário, admiração por parte da direção, colaboradores e status no mercado por comandar o jornalismo de uma das maiores emissoras de televisão de agronegócio do País para se dedicar aos filhos que estavam precisando muito dela. “Se eu tive uma carreira foi graças à ajuda da minha mãe, que cuidava das minhas crianças, mas ela havia adoecido, assim como a babá que nos dava suporte também havia se machucado e ficaria afastada por quase meio ano pelo INSS. Tive que escolher entre o trabalho e a minha família. Não aconselho ninguém a fazer o que eu fiz, que é deixar o emprego. É preciso ter estômago para aguentar as consequências, porque elas vêm e são implacáveis”, sentencia.
Mas também teve o seu lado bom. A jornalista ficou mais perto dos dois filhos e foi aí que surgiu a oportunidade de rodar o Brasil como mestre de cerimônias e conhecer o Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima, Alagoas e Piauí à frente da mediação de seis audiências públicas lideradas pelo BNDES, Ministério de Minas e Energia, Eletrobras e a multinacional PwC Brasil. “Mediei conflitos graves como MC e tornei-me mais experiente, conheci novas culturas, novos sabores e vi de perto a situação dos refugiados venezuelanos em Boa Vista (RR). Se eu tivesse continuado no meu antigo trabalho, não teria conhecido tantos lugares novos”, fala com um ar de satisfação.
Lilian também entrou de cabeça no empreendedorismo digital, escreveu um e-book de 115 páginas intitulado “Os Pilares do Agronegócio”, que trata de gestão, lançou um curso chamado Sementes Digitais sobre marketing digital no agronegócio, fez centenas de amigos virtuais, novas parcerias profissionais, foi contratada para um job de vídeo por uma grande multinacional do agronegócio e também passou a visitar mais o campo. Como propósito, missão de vida para contribuir com a agropecuária brasileira, criou um seminário 100% online e 100% gratuito chamado Radar do Campo, com o apoio da Agrofilmes, com grandes nomes do setor que falam sobre Marketing Rural, Leis Ambientais e Trabalhistas no Campo, Solo e Pastagem, Controle Biológico, Gestão no Campo, Riscos Climáticos e Sustentabilidade nas Estratégias de Negócios Agropecuários.
Enfim, fechou dezembro de 2018 como âncora do NovoAgro, um programa televisivo totalmente independente, exibido pela TV Clima Tempo para 10 milhões de assinantes (Sky, Vivo, Oi, GTV, Nossa TV, TV Alphaville e Net Angra dos Reis). Agora, em 2019, ajudou a lançar o Portal AgroExpert, especializado em cursos voltados para profissionais do agronegócio e também é muito presente nas redes sociais por meio de vídeos com orientações sobre empreendedorismo, carreira, marketing e comunicação. Recentemente, foi convidada pelo portal “BR MaisNews” para gravar boletins radiofônicos sobre agronegócio e que são distribuídos para mais de duas mil rádios em todo o Brasil. Questionda por mim se ela realmente fez uma loucura largando o emprego, ela foi categórica: “Fui muito feliz no meu trabalho. Desenvolvi vários talentos, porque muitos estagiários que passaram por mim se tornaram repórteres e apresentadores de TV. É muito gratificante contribuir para o crescimento das pessoas, mas foi chegada a hora em que precisei encontrar um novo caminho. E sabe o que é loucura para mim? É continuar fazendo as mesmas coisas e ainda assim esperar por resultados diferentes. Não é fácil encarar mudança, dói para burro, mas só assim se constrói a vida que almejamos”, explica.
Lilian largou o trabalho CLT no agronegócio e passou a empreender no mesmo setor para levar uma grande mensagem aos profissionais e produtoras e produtores rurais de todo o Brasil de que só o conhecimento transforma e de que é preciso melhorar urgentemente a comunicação entre o campo e a sociedade. “Cresci saboreando a vida que surge da terra de cima de um pé de jaboticada e apreciando a vista da cidade grande que parece hostil, mas que também tem o seu valor e seu acolhimento. Acho que é por isso que entendo, amo, não julgo e valorizo tanto os dois lados: o campo e a cidade”, justifica.
Além de levar informação sobre capacitação, uma das missões do programa de TV da jornalista, o NovoAgro, é incentivar a união entre o campo e a cidade e estimular que parem com as divergências entre dois estilos de vida tão necessários. “A gente tem que trabalhar para que essa valorização mútua brote tanto no campo quanto na cidade. A vida é muito curta para tanto ódio. Prova disso é que a minha querida tia, dona do pé de jaboticaba no meio do concreto da cidade grande, está muito doente e estamos todos na torcida de sua recuperação. Entretanto, seja o que for que a vida lhe reserve, ela já deixou o seu legado: de que o campo e a cidade podem, sim, conviver em harmonia”, afirma com veemência.
Entre suas novas metas para explorar o mundo estão uma viagem com a mãe e os filhos para a Disney e outra com o marido pela Europa. E olha só: ela prometeu que volta aqui para contar para gente como foram as viagens e também deixou um recado para você: “Não fique só falando e prometendo que vai viajar. Tire o passaporte agora e comece a pagar a sua viagem imediatante, porque você não vai se arrepender”, finaliza.