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A POLÊMICA SOBRE A LEI DA GORJETA NOS RESTAURANTES

O ato de conceder gorjeta é muito antigo, utilizado  em várias atividades com o propósito de gratificar um prestador de serviço, com um valor não incluído no preço estipulado pelo produto.

Nos bares e restaurantes, espontânea ou sugerida  como “taxa de serviço não obrigatória”, a gorjeta vinha provocando inúmeras polêmicas.

O principal motor de incompreensão esteve no fato da Justiça do Trabalho interpretar a gorjeta dada pelo cliente ao garçom, como remuneração paga pelo estabelecimento. Em muitos casos o empresário sequer tinha ciência do total de gorjetas recebidas  por seus funcionários. Uma vez que o juiz considerava gorjeta como sendo remuneração, sobre o total recebido pelo funcionário, a empresa era condenada a pagar encargos: FGTS, INSS, férias acrescidas de 1/3 e 13º salário, em alguns casos horas extras e adicional noturno.

Portanto, o empresário combinava de pagar um salário ao funcionário ou pagava conforme a convenção coletiva de trabalho (CCT), mas na reclamação o juiz decidia que esse salário era o dobro ou bem mais.

 A exemplo, se o garçom recebesse R$ 1.000,00 por mês como gorjeta com repasse total,  a empresa ainda teria que pagar valores expressivos de encargos sobre essa verba. Se o garçom ganhasse por vários anos a gorjeta sem que a empresa lhe pagasse os encargos, ao final este reclamava e a empresa sofria condenações difíceis de serem cumpridas,  devido ao valor acumulado e sobre o qual incidia correção monetária, juros, multas e  verbas previdenciárias.

A maioria das empresas sempre concordou em repassar a totalidade das gorjetas para os  funcionários, mas jamais em pagar sobre o valor da gorjeta, dada voluntariamente pelo cliente. No sentido de evitar divergências e manter a harmonia, imprescindível  para criar um clima de paz e tranquilidade, os empresários  e  trabalhadores  fizeram um acordo: as empresas  reteriam da receita da gorjeta valores suficientes para pagar os encargos:  férias,  13°, FGTS e INSS.

O INSS é pago diretamente a União, mas beneficia o trabalhador com melhor aposentadoria no futuro. Trata-se de proposta com a qual todos os sindicatos laborais concordaram;  fizeram-se convenções coletivas com essa cláusula em todo o país.

No entanto, essa fórmula foi mal compreendida, trabalhadores e clientes nem sempre entendiam, acabando por acusar os empresários do setor de  apropriação de parte da gorjeta dos funcionários. Claro que há maus empresários, como em qualquer setor de atividade, mas a maioria preferia seguir a convenção, para não ter problemas com a equipe, de quem dependia o bom atendimento ao cliente, e para evitar problemas com as fiscalizações dos sindicatos, promotores, fiscais do Ministério do Trabalho e Justiça do Trabalho ou mesmo passivo trabalhista.

As denúncias continuaram e também as condenações da Justiça do Trabalho, que não aceitava as convenções coletivas. Para resolver a questão,  empresários (no caso da ABRASEL com votação favorável de presidentes das 27 seccionais existentes pelo país), e trabalhadores representados (sindicatos, federações e confederações) por suas entidades, se mobilizaram  para apoiar uma lei que regulamentasse a gorjeta.

O resultado após muitos  anos de debate foi a Lei  nº 13.419,  que entrou em vigor dia 13 de maio deste ano, com o propósito de regulamentar a distribuição da gorjeta.Com conteúdo muito semelhante às convenções coletivas existentes,  a lei permite que as empresas que estão no SIMPLES retenham  20%  e as que estão fora desse sistema de tributação (lucro real e lucro presumido), retenham  33% da receita da gorjeta para pagar os encargos referidos. O percentual destas últimas é maior por terem elas que pagar INSS,  que no SIMPLES já é recolhido com percentual único sobre faturamento.  Ou seja, todo o valor arrecadado como gorjeta será pago ao trabalhador ou encargos em seu benefício.

Vale ressaltar, que a lei é genérica e não especifica certos detalhes:

  • Não informa se no período atual prevalece a convenção ou a lei, ambas em vigor.
  • Divisão –  não esclarece quanto da gorjeta será deferida a cozinha e quanto ao salão, e como será distribuída entre os funcionários, se proporcional ao salário

fixo pago pela empresa (chefs/maítres ganham mais) ou de forma igualitária.

Para disciplinar esta distribuição a lei previu a possibilidade de se ter assembleias de funcionários. Haverá ainda comissões de empregados para fiscalizar a aplicação das regras.

A União foi a mais beneficiada,  pois passa a receber 8% de INSS do trabalhador sobre o montante arrecadado como gorjeta e também receberá INSS das empresas que estão fora do simples; incluindo imposto de renda  de muitos trabalhadores cuja remuneração ultrapassa o teto de isenção. Será recolhido FGTS, verba controlada pela União e que será disponibilizada ao trabalhador somente no caso de demissão sem justa causa, na aposentadoria ou em situações específicas.

A gorjeta continua voluntária; pode até ser sugerida como taxa de serviço, mas continua não obrigatória, fica a critério do cliente, que pode deixar 10%, mais ou menos. O estabelecimento insere essa sugestão na nota de consumo (como consta na lei), a que é entregue para ser conferida pelo cliente. O cliente, mesmo pagando a gorjeta, tem direito à nota fiscal, mas sem o valor da gorjeta, pois este não conta como faturamento do estabelecimento, é totalmente entregue ao funcionário ou pago como encargos.

Após a adequação à lei certamente haverá mais harmonia, empresários e funcionários terão mais segurança jurídica. A União deve dar-se por satisfeita, por receber FGTS, INSS e imposto de renda, além de aumentar a arrecadação do FGTS, dessa imensa massa salarial. O cliente também pode ficar mais tranquilo, por saber que a gorjeta vai beneficiar o trabalhador.

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ABRASEL-SP – Associação Brasileira de Bares e Restaurantes – São Paulo

Percival Maricato – Presidente e advogado especialista no setor