Brasil, meu amigo
Neste circo de horrores
Entre covas abertas
esperanças dispersas
E cestas básicas
de amor
destilo minhas dores
À porta do campo
de um irmão amado
que sem flores nem vela
foi sepultado.
silêncios contidos
entre o bater panelas
e a visão dolorosa
buscando sentido
da varanda gourmet
ao ser impedido
de chorar o amigo
no Vila Formosa
No rol do superficial
ao se encarar o caos
fake news foi a jato
e o aplicativo
modificou o fato
a verdade
mistura-se à
Infantilidade
e não querer ir fundo
é o medo de olhar
pra si
e ver o fim
de um ciclo
da vida
de um mundo.
É o cúmulo da paciência
ao ver as covas rasas
No enterro do amigo
e a incredulidade na ciência.
Me deparar com a morte
tão próxima
no bairro do pobre
No bairro do rico.
Como é que é possível
ser tão insensível
a querer ser o centro
do poder
dono da atmosfera
e do ar
se faltam hospitais
médicos
e máquinas para respirar
A vaidade do cargo
e o elixir do querer
embriagam o ego
Imposssibilitado de ver
a verdade nua
nas ambulâncias
nos necrotérios
nas ruas.
Não interessa o que vai dizer o jornal
Forja-se o Diário Oficial
Neste mesmo dia
O último bastião da República
Saiu do Ministério
era uma coluna de mármore
daquelas
dos cemitérios
dos túmulos de verdade
um ministro, um juiz
que fez justiça
e quase
transformou o país
Por um breve momento
quando o corpo caia na cova
e se cobria de terra
daquilo que era um amigo
senti a dor do país
que morre
sem nunca ter sido.
Paulo Atzingen
São Paulo, 24 de abril de 2020.